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O Medo

de Al Berto

editor: Assírio & Alvim, abril de 2017
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Agora na sua 5.ª edição, com renovada capa, «O Medo» reúne toda a poesia de Al Berto.

encosta-te à parede
deixa o fluxo da dor circular
por dentro das imagens febris — agarra o feixe
de cordas de ar — vai
pelo rastro das etéreas aves — chama-as
ao jardim imaginado e dá-lhes a beber
as visões de cinza quente

chama a noite e lança dentro dela
a águia dos mares — a flor escura do sangue
transforma-a em navio rompendo
a bruma deste inverno sem memória

deixa o corpo viajar no desalento
essa fonte do inesgotável canto — melancolia
que os remédios não curam

encosta-te à parede
escuta a inesperada mudez do talento

«regressa do túmulo dos mares do sul
enterra os dedos na penumbra que separa o dia
da noite das cidades recorda o restolhar das serpentes
a seiva lívida do loureiro estremecendo ao sentir
o rosto da criança que foste contra o tronco

na tua memória já não existem paisagens de ossos
nem pássaros nem punhais de luz dentro da insónia
a criança que em ti morreu crescendo
usou sapatos com atacadores e gravata
pela primeira vez foi ao cinema sozinha
com o olhar turvo de melancolia anda por aí
à procura de quem a queira»

Novidades Poema da semana

Poema da semana

notas para o diário

deus tem que ser substituído rapidamente por poe-
mas, sílabas sibilantes, lâmpadas acesas, corpos palpáveis,
vivos e limpos.

a dor de todas as ruas vazias.

sinto-me capaz de caminhar na língua aguçada deste
silêncio. e na sua simplicidade, na sua clareza, no seu abis-
mo.
sinto-me capaz de acabar com esse vácuo, e de aca-
bar comigo mesmo.

a dor de todas as ruas vazias.

mas gosto da noite e do riso de cinzas. gosto do
deserto, e do acaso da vida. gosto dos enganos, da sorte e
dos encontros inesperados.
pernoito quase sempre no lado sagrado do meu cora-
ção, ou onde o medo tem a precaridade doutro corpo.

a dor de todas as ruas vazias.

pois bem, mário – o paraíso sabe-se que chega a lis-
boa na fragata do alfeite. basta pôr uma lua nervosa no
cimo do mastro, e mandar arrear o velame.

é isto que é preciso dizer: daqui ninguém sai sem
cadastro.

a dor de todas as ruas vazias.

sujo os olhos com sangue. chove torrencialmente. o
filme acabou. não nos conheceremos nunca.

a dor de todas as ruas vazias.

os poemas adormeceram no desassossego da idade.
fulguram na perturbação de um tempo cada dia mais
curto. e, por vezes, ouço-os no transe da noite. assolam-me
as imagens, rasgam-me as metáforas insidiosas, porcas. ..e
nada escrevo.
o regresso à escrita terminou. a vida toda fodida – e
a alma esburacada por uma agonia tamanho deste mar.

a dor de todas as ruas vazias.

Al Berto

Novidades poema

Al Berto e «as coisas simples»

hoje é dia de coisas simples
(Ai de mim! Que desgraça!
O creme de terra não voltará a aparecer!)

coisas simples como ir contigo ao restaurante
ler o horóscopo e os pequenos escândalos
folhear revistas pornográficas e
demorarmo-nos dentro da banheira

na aldeia pouco há a fazer
falaremos do tempo com os olhos presos dentro das chávenas
inventaremos palavras cruzadas na areia... jogos
e murmúrios de dedos por baixo da mesa
beberemos café
sorriremos à pessoas e às coisas
caminharemos lado a lado os ombros tocando-se
(se estivesses aqui!)
em silêncio olharíamos a foz do rio
e o brincar agitado do sol nas mãos das crianças descalças
hoje

Al Berto, O Medo

Novidade Poema.png

Al Berto: dois poemas para celebrar a sua vida

Se fosse vivo, Al Berto faria hoje 75 anos. O poeta e editor português, nascido a 11 de janeiro de 1948, encontrou na exaltação do próprio sofrimento a sua forma de expressão literária, ao longo de mais de 20 anos de atividade literária.

A Assírio e Alvim celebra a obra de Al Berto reeditando o último livro do autor, Horto de Incêndio, agora numa edição com sobrecapa. Nas suas páginas, o fogo assume o papel de elo entre os mundos terrestre, intermediário e celeste, de destruição e regeneração, ligado aos ritos de passagem.


RECADO



ouve-me
que o dia seja limpo e
a cada esquina de luz possas recolher
alimento suficiente para a tua morte


vai até onde ninguém te possa falar
ou reconhecer — vai por esse campo
de crateras extintas — vai por essa porta
de água tão vasta quanto a noite


deixa a árvore das cassiopeias cobrir-te
e as loucas aveias que o ácido enferrujou
erguerem-se na vertigem do voo — deixa
que o outono traga os pássaros e as abelhas
para pernoitarem na doçura
do teu breve coração — ouve-me


que o dia te seja limpo
e para lá da pele constrói o arco de sal


a morada eterna — o mar por onde fugirá
o etéreo visitante desta noite


não esqueças o navio carregado de lumes
de desejos em poeira — não esqueças o ouro
o marfim — os sessenta comprimidos letais
ao pequeno-almoço




HORTO



homens cegos procuram a visão do amor
onde os dias ergueram esta parede
intransponível


caminham vergados no zumbido dos ventos
com os braços erguidos — cantam


a linha do horizonte é uma lâmina
corta os cabelos dos meteoros — corta
as faces dos homens que espreitam para o palco
nocturno das invisíveis cidades


escorre uma linfa prateada para o coração dos cegos
e o sono atormenta-os com os seus sonhos vazios


adormecem sempre
antes que a cinza dos olhos arda
e se disperse


Al Berto, Horto de Incêndio

Novidades poema

«Corpo», pela pena de Al Berto

CORPO

Corpo corpo
que te seja leve o peso das estrelas
e de tua boca irrompa a inocência nua
dum lírio cujo caule se estende e
ramifica para lá dos alicerces da casa

abre a janela debruça-te
deixa que o mar inunde os órgãos do corpo
espalha lume na ponta dos dedos e toca
ao de leve aquilo que deve ser preservado

mas olho para as mãos e leio
o que o vento norte escreveu sobre as dunas

levanto-me do fundo de ti humilde lama
e num soluço da respiração sei que estou vivo
sou o centro sísmico do mundo

Al Berto, O Medo

O Medo

de Al Berto

Propriedade Descrição
ISBN: 978-972-37-1404-3
Editor: Assírio & Alvim
Data de Lançamento: abril de 2017
Idioma: Português
Dimensões: 175 x 247 x 40 mm
Encadernação: Capa dura
Páginas: 704
Tipo de produto: Livro
Coleção: Obras de Al Berto
Classificação temática: Livros em Português > Literatura > Poesia
EAN: 978972371404312
Idade Mínima Recomendada: Não aplicável
e e e e e

Muito bom

Catarina Neto

A poesia de Al Berto tem uma voz singular, irreverente mas de uma beleza crua. Este livro é um colosso! Recomendo aos mais progressistas

e e e e e

Uma voz poética avassaladoramente sensível

ABP

“O Medo” é a mais completa montra desta teia delicada de poemas. Neste lugar, o sensível é um verbo de uma escrita sem tréguas que se consome na sua absoluta elegância.

e e e e e

A beleza feita agressividade das palavras.

José Lopes

O privilégio de poder "devorar", numa só obra, o génio da poesia de Al Berto. Livro de leitura imprescindível, para qualquer amante de poesia, é uma fonte dos sentidos e um olhar sobre o que de melhor se escreveu, no género, em portugês. Imperdível!

e e e e e

"O" Livro

João Paulo Coelho

Em termos de poesia nacional contemporânea, este é, para mim, "O" livro. Al Berto era um génio com as palavras, e não conseguia viver sem elas. Cada dia que passava sem escrever era um lugar incompleto. Um poeta deve, parece-me, achar um meio-termo entre escrever e viver. Al Berto, no entanto, vivia a escrita, vivia dentro das palavras, e morreria se lhas tirassem. Deixou-nos, assim, esta obra poética extraordinária, e que guardo com estima.

Al Berto

Poeta e editor português, de nome completo Alberto Raposo Pidwell Tavares, nasceu a 11 de janeiro de 1948, em Coimbra, e faleceu a 13 de junho de 1997, em Lisboa. Tendo vivido até à adolescência em Sines, exilou-se, entre 1967 e 1975, em Bruxelas, dedicando-se, entre outras actividades, ao estudo de Belas-Artes. Publicou o primeiro livro dois anos depois de regressar a Portugal.
Em mais de vinte anos de atividade literária, a expressão poética assumida por Al Berto, o pseudónimo do autor, distingue-se de qualquer outra experiência contemporânea pela agressividade (lexical, metafórica, da construção do discurso) com que responde à disforia que cerca todos os passos do homem num universo que lhe é hostil. Trazendo à memória as experiências poéticas de Michaux ou de Rimbaud, é no próprio sofrimento, na sua violenta exaltação, na capacidade de o tornar insuportavelmente presente (nas imagens de uma cidade putrefacta, na obsidiante recorrência da morte e do mal, sob todas as suas formas) que a palavra encontra o seu poder exorcizante, combatendo o mal com o mal. É neste sentido que Ramos Rosa fala de uma "poesia da violência do mundo e da realidade insuportável": "a opacidade do mal ou a agressividade do mundo é tão intensa que provoca um choque e um desmoronamento geral", mas "à violência desta destruição responde o poeta com uma violenta negatividade que é uma pulsão de liberdade absoluta, que procura por todos os meios o seu espaço vital.", sublinhando ainda a forma como esta espécie de "grito de fragilidade extrema e irredutível do ser humano, do seu desamparado infinito, da sua revolta absoluta e sem esperança", se consubstancia, ao nível do estilo, num ritmo "ofegante, precipitado, como um assalto contínuo feito de palavras tão violentas como instrumentos de guerra" (cf. ROSA, António Ramos - A Parede Azul. Estudos Sobre Poesia e Artes Plásticas, Lisboa, Caminho, 1991, pp. 120-121). No domínio editorial, a sua atividade pautou-se pela isenção e certa ousadia relativamente às políticas comerciais livreiras dominantes.
Inicialmente seguindo uma estética surrealizante de temática erótica, em O Anjo Mudo (1993) funde prosa e poesia, exprime intertextualidades, numa viagem marginal e purificadora. A quase totalidade da sua obra poética encontra-se coligida em O Medo.
Foi galardoado com o Prémio Pen Club de Poesia em 1987.

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