Rumo ao Farol

O tempo. A vida. O que faz com que alguns momentos se cristalizem, vivendo na nossa memória muito para lá de terem acontecido, e outros se extingam irremediavelmente no instante seguinte? O que confere substância e sentido às nossas vidas? A partir da expectativa da visita ao Farol, Woolf constrói uma narrativa tocante, na qual a família Ramsay, os restantes convidados, a casa de férias e o Farol são os protagonistas. Escrito num estilo próprio do Modernismo (de que a autora foi uma das vanguardistas), numa mescla de discurso indireto livre e fluxo de consciência, “Rumo ao farol” é um livro que nos convida à reflexão sobre alguns dos mais profundos e fundamentais temas da natureza humana, numa abordagem plena de sensibilidade, alegorias e de personagens que representam a complexidade e a diversidade do ser humano. É uma obra de parca ação, mas a profundidade de cada momento e de cada personagem não o é. A forma caleidoscópica com que Woolf nos apresenta cada personagem, permite lançar luz sobre as mais recônditas sombras escondidas em cada uma delas, tornando-nos seus íntimos conhecedores. De todas as personagens emerge uma necessidade inata de procura de propósito de vida e de perpetuação, quer seja através de Mrs. Ramsay, uma das figuras centrais desta história, que representa o papel convencional da mulher da época, desempenhando fervorosamente o papel de mãe e esposa; quer seja através de Mr. Ramsay, uma figura mais áspera e autoritária, que vive na eterna insegurança de saber se a sua obra (publicou um livro de Filosofia) vai perdurar no tempo; ou mesmo através da Lily Briscoe, uma jovem artista (pintora), a quem Mrs. Ramsay tenta impor um namorado, mas que só está interessada na sua arte como forma de perenidade e de realização pessoal;  Há muitas camadas para explorar nesta obra, apenas toquei nalgumas delas. Acima de tudo, fica o sentimento de estremecimento que só se tem perante uma obra que nos toca indelével e profundamente, daquelas que nos enriquecem, mesmo quando (ou porque) nos levanta mais perguntas do que nos dá respostas.