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A Campânula de Vidro

de Sylvia Plath
editor: Relógio D'Água, agosto de 2016
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«The Bell Jar veio pela primeira vez a público em Inglaterra, no dia 14 de janeiro de 1963, editado pela Heinemann, com autoria atribuída a Victoria Lucas. O motivo que terá levado Sylvia Plath a recorrer a um pseudónimo prende-se com a óbvia coincidência existente entre personagens, eventos e lugares ali descritos, e a realidade biográfica da autora. Essa confusão entre realidade e ficção tem servido, ao longo dos anos, a uma vasta panóplia de equívocos que mais não fizeram do que dissimular o lugar da sua obra poética e narrativa na literatura anglo-americana contemporânea.» Do Posfácio
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A nossa necessidade de consolo é impossível de satisfazer

Encontramos em muitos livros personagens confrontados com a dor, a perda e a solidão, e reconhecemos neles um pouco da nossa própria busca infrutífera por consolo. A frase de Stig Dagerman, «a nossa necessidade de consolo é impossível de satisfazer», serve de mote para falar de cinco obras. Estes livros, de épocas e estilos distintos, falam sobre o desamparo existencial e questionam se a arte ou a palavra podem aliviar a angústia. Em A Nossa Necessidade de Consolo é Impossível de Satisfazer (1952), de Dagerman, A Campânula de Vidro (1963) , de Sylvia Plath, O Ano do Pensamento Mágico (2005), de Joan Didion, O Quarto de Giovanni (1956), de James Baldwin, e O Acontecimento (2000), de Annie Ernaux, percebemos diferentes lados do sofrimento humano. Seja na desesperança filosófica, na depressão sufocante, no luto atordoado, no amor proibido ou na experiência traumática, todos estes relatos íntimos partilham uma verdade profunda: a de que o consolo, quando existe, é precário e fugaz.
Cada autor, à sua maneira, expõe feridas pessoais e colectivas. Emerge dessas obras uma reflexão comum: podemos procurar refúgio na fé, na arte, no amor ou na memória, mas talvez nenhum refúgio seja completo. Ainda assim, a literatura torna-se ela própria um espaço onde a dor é dita e, ao ser dita, partilhada. Com um tom ensaístico, íntimo e por vezes poético, exploro como cada um destes livros trata a questão do consolo impossível, articulando temas existenciais, sociais e estéticos, e como a escrita e a leitura se entrelaçam neste processo de busca pelo inatingível. Stig Dagerman Stig Dagerman abre esta discussão sobre a impossibilidade do consolo de forma frontalmente filosófica. No seu breve ensaio A Nossa Necessidade de Consolo é Impossível de Satisfazer, escrito em 1952, o autor sueco expõe a desesperança de quem vive sem as âncoras tradicionais: sem fé religiosa, sem ideologias redentoras, enfrentando a vida como «uma errância absurda a caminho da morte certa». Dagerman descreve-se como um caçador de consolo, alguém que persegue avidamente qualquer coisa que o possa aliviar do vazio. De vez em quando abate uma presa: um momento fugaz de prazer, amor ou inspiração, mas ao segurá-la entre os dedos vê quão rapidamente ela se esfuma. Admite que, sendo a necessidade infinita, «é sempre escasso o que tenho» enquanto consolo. Essa constatação amarga permeia o texto: por mais que se busque saciar a sede de sentido, ela renasce incessantemente. Dagerman cataloga as formas de consolo que o tentam ou perseguem: o prazer, o talento, a solidão escolhida, até o desejo de morte, cada uma sussurrando-lhe promessas envenenadas. Todas se revelam ilusórias, mantendo-o no fio da navalha entre dois abismos. A única consolação verdadeira, sugere num momento quase esperançoso, seria a certeza da liberdade individual – a convicção de ser um espírito soberano. Mas nem isso lhe é plenamente acessível: «a liberdade começa na escravidão e a soberania na dependência», escreve, reconhecendo o paradoxo de que mesmo o sentimento de liberdade está condicionado pelo medo e pela vulnerabilidade. O consolo, quando genuíno, talvez consista em aceitar essa condição trágica de ser livre e impotente ao mesmo tempo.
Em termos estéticos, o ensaio de Dagerman é escrito numa prosa lírica e confessional, aproximando-se da voz de um poeta-filósofo. A linguagem é metafórica (a caça, o fio da navalha, o vento que traz um sopro de alívio) mas também direta na sua conclusão. Não há enredo nem personagens além do próprio “eu” reflexivo – é um monólogo interior que poderíamos imaginar dito na penumbra de um quarto, a altas horas da noite, à frente do espelho. A força deste texto reside precisamente na ousadia de nomear o desamparo sem subterfúgios. Dagerman chega a reconhecer que até o acto da escrita e da criatividade artística foi, para ele, uma forma de consolo – e uma forma falhada. Ele conta que encheu páginas com as mais belas palavras, publicou um livro e recebeu louros por isso, mas mesmo assim permaneceu vazio, pois “só desejo o que jamais obterei – a certeza de que as minhas palavras tocaram o coração do mundo». A literatura, que ele pensava poder justificá-lo ou ligá-lo aos outros, revelou-se um “risível consolo”, uma vez que o sucesso literário apenas o tornou ainda mais consciente da sua solidão. Aqui Dagerman antecipa uma questão crucial: escrever sobre a dor pode aliviar quem escreve? Ou será apenas um paliativo temporário? A trágica biografia de Dagerman – que se suicidaria poucos anos depois de escrever este ensaio – confere um peso ainda maior às suas palavras. Sente-se que ele fala da beira de um abismo pessoal. No entanto, ao lermos hoje o seu texto, algo de paradoxal acontece: apesar do tom sombrio, muitos leitores encontram uma estranha forma de consolo na identificação com esse desamparo expressado. A lucidez de Dagerman em admitir a insaciabilidade do consolo pode fazer-nos sentir compreendidos na nossa própria inquietação. Em suma, ele não oferece respostas fáceis – apenas a honestidade cruel de que estamos sós com a nossa necessidade infinita. Mas ao menos, ao ler Dagerman, estamos juntos nessa solidão. A sua escrita, ao escancarar a impossibilidade de consolo, aproxima-se do leitor de forma íntima, quase cúmplice. QUERO LER! » A Campânula de Vidro, de Sylvia Plath Se Dagerman formula filosoficamente a sede insaciável de consolo, Sylvia Plath encarna essa sede através de uma narrativa semiautobiográfica. A Campânula de Vidro (The Bell Jar), único romance da poetisa americana, leva-nos para dentro da mente de Esther Greenwood, uma jovem que desliza para a depressão profunda enquanto tenta viver de acordo com as expectativas da sociedade nos anos 1950. Plath escreve numa primeira pessoa tão íntima que quase dói – acompanhamos Esther em Nova Iorque, onde ganha um estágio numa revista de moda, e depois de volta à sua casa nos subúrbios, onde a sua saúde mental se deteriora. A certa altura, Esther descreve a sensação de estar presa «sob a mesma redoma de vidro, sendo lentamente cozida no [seu] próprio ar viciado». A campânula de vidro é a metáfora central do romance: simboliza a prisão invisível da depressão, que isola a pessoa do mundo e a sufoca na sua própria atmosfera de pensamentos tóxicos. Não importa onde Esther esteja – «fosse o convés de um navio, um café parisiense ou Bangcock» –, ela carrega consigo essa redoma opressiva. Ou seja, nenhuma mudança externa lhe traz alívio; a perturbação está dentro dela, impenetrável, tornando impossível qualquer consolo duradouro vindo de fora. Não importa onde Esther esteja – «fosse o convés de um navio, um café parisiense ou Bangcock» –, ela carrega consigo essa redoma opressiva. Ou seja, nenhuma mudança externa lhe traz alívio; a perturbação está dentro dela, impenetrável, tornando impossível qualquer consolo duradouro vindo de fora. Ao longo do livro, vemos Esther procurar (ou ser compelida a procurar) formas de escapar ao seu sofrimento: ela visita um psiquiatra e sofre um tratamento de choque mal administrado; pondera e tenta o suicídio de diversas formas; chega a ser internada. Cada tentativa de ajuda parece falhar inicialmente – o mundo médico é retratado de forma assustadora, e a incompreensão das pessoas em volta de Esther aprofunda o seu sentimento de alienação. Plath, que vertera muito da sua própria experiência de colapso mental em 1953 nesta ficção, não adoça a realidade: a descrição da apatia e desesperança de Esther é visceral. A dado momento, a narradora diz: «Eu não via motivo para me levantar. Eu não ansiava por nada.», encapsulando o vazio depressivo onde nem sequer o desejo de melhorar existe. A ausência de desejo é a ausência de consolo – nada no horizonte que a anime ou conforte.
Do ponto de vista social, A Campânula de Vidro é também uma crítica ao papel sufocante que era reservado às mulheres da época. Esther sente-se dividida entre os diversos “figos” de possibilidades de vida – numa famosa passagem, imagina uma figueira com frutos que representam futuros alternativos: ser mãe e esposa, ser poeta, ter uma carreira brilhante, viajar pelo mundo. Ela gostaria de experimentar todos, mas ao hesitar, vê-os apodrecer e cair um a um. Esta alegoria dolorosa reflete as expectativas conflituosas sobre a mulher jovem nos anos 50: a pressão para casar e ter filhos versus o desejo de realização pessoal e liberdade. Esther conclui que qualquer escolha a fará perder todo o resto – e essa paralisia contribui para o seu desespero. O consolo que a sociedade lhe oferece é vazio, pois consiste em promessas de segurança doméstica ou sucesso material que não falam à sua angústia interior. Ao contrário, essas expectativas só a fazem sentir-se mais inadequada por não conseguir corresponder com alegria. Assim, a solidão de Esther é existencial e também uma solidão social, fruto de não se encaixar no molde esperado (da “mulher sempre sorridente”, como ironicamente Plath sugere num trecho do poema “Lady Lazarus” citado no início do livro).
Esteticamente, Plath mistura um tom confessional cru com momentos de humor negro e lirismo. A prosa de A Campânula de Vidro é direta e pungente, mas há imagens poéticas memoráveis (como a própria redoma, ou descrições oníricas das noites quentes em Nova Iorque sob um céu que parece “brilhar branco e frio” enquanto Esther deseja ser afiada como a lâmina de uma faca). Essa oscilação entre o concreto e o poético intensifica a intimidade do relato – o leitor sente-se dentro da cabeça de Esther, partilhando a sua perspetiva distorcida e por vezes grotescamente clara sobre o mundo. Por exemplo, ela observa numa festa que “os rostos [das pessoas] eram vazios como pratos” , ilustrando a despersonalização.
Em termos de consolo (ou da falta dele), A Campânula de Vidro termina num tom ambíguo. Após meses de tratamento, Esther melhora e prepara-se para deixar a instituição psiquiátrica. Há uma ténue sugestão de esperança – a redoma de vidro foi levantada. No entanto, paira a incerteza: e se a redoma voltar a descer? Plath deixa implícito que a ameaça da recaída estará sempre presente. De facto, sabemos pela vida real que a própria autora, apesar de ter escrito este livro após sê recuperar, acabaria por suicidar-se alguns anos depois da publicação. Esse conhecimento extraliterário reveste a leitura de uma aura trágica: percebemos que nem mesmo a criação literária salvou Plath de si mesma. A escrita foi talvez um alívio momentâneo – um modo de transformar em arte o que doía –, mas não garantiu uma cura permanente. Ainda assim, há um legado profundamente consolador na obra de Plath para os leitores que passaram por experiências semelhantes. Muitos encontram em Esther Greenwood uma espécie de espelho fiel da depressão, e nesse reconhecimento há uma forma de consolo: o consolo de se sentir compreendido. A literatura, neste caso, não resolve a angústia de existir, mas tece uma solidariedade silenciosa entre autora, personagem e público. Plath mostra a ferida sem prometer um bálsamo – mas às vezes, ver a ferida refletida já é um lenitivo, ainda que insuficiente, para a alma em sofrimento. QUERO LER! » O Ano do Pensamento Mágico, de Joan Didion Em O Ano do Pensamento Mágico, Joan Didion oferece-nos um relato memorialístico do luto, escrito numa prosa contida e elegante que contrasta com o turbilhão emocional subjacente. A obra nasceu de uma tragédia pessoal precisa: em Dezembro de 2003, o marido de Didion, John Gregory Dunne, morreu subitamente de ataque cardíaco, à mesa de jantar, pouco depois de visitar no hospital a filha do casal, Quintana, que se encontrava em coma induzido por uma septicemia. Didion,l deparou-se então com “o período mais negro da [sua] vida”, e fez o que sabia fazer melhor – escreveu sobre isso. O livro, publicado em 2005, disseca o ano subsequente à perda do marido, num misto de diário de luto, reflexão clínica e confissão íntima. O título refere-se àquilo que Didion identifica em si própria durante esse tempo: o pensamento mágico, isto é, a crença irracional, quase infantil, de que de alguma forma ela poderia reverter a morte ou trazer o marido de volta se seguisse certos rituais ou evitasse determinadas ações. Uma das passagens mais reveladoras é quando Didion relata a sua relutância em desfazer-se dos pertences de John, em especial dos seus sapatos. Didion sabia racionalmente que o marido morrera, mas uma parte dela ainda esperava por ele, ainda queria manter as condições para o seu regresso (como se de um momento para o outro a morte pudesse ser negada e John entrasse pela porta a perguntar pelos sapatos favoritos). Essa dissonância entre razão e emoção é um dos pontos centrais do livro. «O luto é um lugar que nenhum de nós conhece até chegarmos lá». Podemos pensar que sabemos como reagiremos a uma perda profunda, mas até a vivermos não imaginamos os pensamentos ilógicos e comportamentos estranhos que teremos. A autora confessa que, nos primeiros dias, não conseguia sequer aceitar mentalmente a palavra morte aplicada ao marido – ela vivia numa espécie de neblina em que ele estava simultaneamente morto e prestes a voltar para jantar.
Do ponto de vista existencial, Didion explora o abismo súbito que a morte abre no quotidiano. Um minuto, estão a preparar-se para jantar; no minuto seguinte, ela está a ver os paramédicos a tentarem reanimar John no chão da sala. Toda a estrutura de sentido da vida se estilhaça num instante. Didion descreve o luto quase como um estado alterado de consciência, uma espécie de loucura temporária mas necessária. Cita estudos psicológicos, poemas e até manuais médicos, numa tentativa de se agarrar a algo concreto que explique a sua experiência – mas acaba por concluir que o luto escapa às lógicas comuns. A nossa sociedade, de certo modo, pouco prepara para o luto real, e Didion sente essa inadequação. Amigos bem-intencionados dizem-lhe clichês como “o tempo cura” ou evitam falar de John para não a magoar, mas ela percebe que isso não a ajuda; pelo contrário, ela precisa de falar dele, de lembrar, de reviver memórias, porque a ausência é ensurdecedora.
No aspeto social, O Ano do Pensamento Mágico revela também a solidão do enlutado. Apesar de rodeada de pessoas (médicos, familiares, a filha quando recupera), Didion atravessa a dor fundamentalmente só, porque é uma experiência intransmissível. O mundo à volta continua – e ela estranha profundamente como a vida quotidiana dos outros continua normal, enquanto o seu mundo parou na noite de 30 de Dezembro de 2003. Essa discrepância reforça o sentimento de que não há consolo externo possível: nada do que alguém diga ou faça trará John de volta ou preencherá o vazio. O único consolo parcial vem do próprio processo de compreensão e aceitação, que Didion vai conquistando lentamente ao longo do ano. E essa aceitação não surge de um momento catártico, mas de uma acumulação de pequenos realinhamentos interiores – por exemplo, quando ela finalmente consegue dar os sapatos do marido para caridade, reconhecendo que ele realmente não vai voltar a usá-los.
Esteticamente, Didion adota uma estrutura fragmentária e repetitiva que imita a mente em luto. Frases e observações reaparecem ao longo do texto, quase como refrões da mente. Ela volta várias vezes aos detalhes da noite da morte, analisa entradas do seu diário, cita versos de W. H. Auden (“Stop all the clocks”, o célebre poema de luto) e vai compondo uma tapeçaria de sentido a partir destes retalhos. Não há uma linearidade estrita; há avanços e recuos, memórias entrelaçadas com o presente. Essa forma é um retrato estilístico da desorientação do luto. Contudo, Didion nunca descamba para o sentimentalismo exagerado; pelo contrário, mantém um tom contido, quase clínico em certos momentos, o que paradoxalmente torna a leitura ainda mais emocionante. Percebemos a dor justamente nas entrelinhas dessa contenção – nas frases curtas que terminam em seco, nos parágrafos interrompidos, na enumeração exaustiva de formalidades post-mortem (certidões, atestados, contas hospitalares).
No fim do livro, Didion não oferece uma resolução redentora. A filha Quintana acaba por falecer também, menos de dois anos depois do pai, facto que Didion abordaria num livro seguinte (Noites Azuis). Mas neste primeiro memoir, o foco é a assimilação da morte de John. Didion aprende que nenhuma quantidade de pensamento mágico trará o marido de volta. O último capítulo mostra-a a arrumar as coisas e a recordar momentos do passado com ele, compreendendo enfim que tem de deixá-lo ir para continuar. Não é um “final feliz” – é real. O consolo aqui é ténue: reside talvez na clareza que a escrita lhe deu. Didion afirma que escrever o livro foi uma maneira de sobreviver. De certa forma, O Ano do Pensamento Mágico é a autora a construir racionalmente um caminho por entre a loucura do luto, usando as palavras como degraus sobre o abismo. Para os leitores, o valor consolador do livro é enorme, porque Didion consegue articular o indizível. Ao ler, por exemplo, que ela se sentiu “completamente louca” e inconsolável, a acreditar em coisas absurdas para trazer o marido de volta, alguém que tenha passado por uma perda semelhante pode sentir-se validado na sua própria “loucura” transitória. Didion demonstra que não há certo ou errado a forma como vivemos a dor – há apenas a necessidade de a viver. A literatura, neste caso, torna-se um espaço seguro onde o luto, com toda a sua irracionalidade e sofrimento, pode existir sem ser julgado. Não satisfaz a necessidade de consolo (pois nada pode realmente compensar a ausência de quem amamos), mas dá voz a essa necessidade e à experiência de não ser consolado. QUERO LER! » O Quarto de Giovanni, de James Baldwin No romance O Quarto de Giovanni, de James Baldwin, a impossibilidade de consolo assume a forma de um trágico amor proibido e da profunda culpa e solidão que dele decorrem. Baldwin, escritor afro-americano que viveu boa parte da sua vida como expatriado na Europa, publicou esta obra em 1956, desafiando os tabus da época ao retratar abertamente uma relação homossexual masculina. A história é narrada na primeira pessoa por David, um jovem norte-americano em Paris, que relembra o seu envolvimento intenso com Giovanni, um barman italiano, enquanto aguarda, numa casa no sul de França, a execução de Giovanni, condenado por um crime. Logo na abertura do romance, David confessa o pressentimento do desastre. A frase inicial estabelece um tom de fatalidade e angústia: sabemos de antemão que algo irreparavelmente doloroso aconteceu (ou está para acontecer) e que David carrega um fardo insuportável. A manhã terrível a que ele alude é aquela em que Giovanni será executado, e David sente-se responsável por esse destino trágico. A partir daí, Baldwin leva-nos numa longa retrospeção, em que o narrador revê os caminhos que os trouxeram a este ponto sem retorno. David, vindo de uma América puritana, tenta inicialmente encontrar consolo na negação de si – está noivo de Hella, uma jovem mulher, e planeia casar com ela para se encaixar no que é socialmente aceite. Ele acredita que, ao seguir o guião tradicional (heterossexual, viril, “normal”), poderá escapar às dúvidas sobre a própria identidade. Trata-se de um consolo ilusório, porque reprime a sua verdade. Quando Hella viaja temporariamente, David conhece Giovanni e acaba por se render à paixão. No pequeno e desarrumado quarto de Giovanni, os dois homens vivem algumas semanas de amor quase conjugal, isolados do mundo exterior. Aquele quarto torna-se um microcosmos onde, por breves instantes, David parece encontrar um refúgio – um lugar onde pode ser ele mesmo e sentir-se amado. Baldwin descreve com delicadeza e intensidade estas cenas: há ternura, há desejo, mas também uma sombra constante de vergonha a toldar a felicidade de David. Ele não consegue libertar-se do pensamento do “pecado” que julga estar a cometer, nem do medo do julgamento alheio. Assim, mesmo no auge daquilo que poderia ser o consolo – o amor correspondido – a inquietação nunca o abandona. David chega a sentir repulsa por Giovanni em certos momentos, mas percebemos que é projeção da repulsa que sente por si e pelo que a sociedade o ensinou a desprezar.
A tensão trágica do romance advém do facto de que David, incapaz de reconciliar o seu amor com a sua consciência, opta por abandonar Giovanni quando Hella retorna a Paris. Ele foge do quarto (foge da possibilidade de viver aquele amor), achando que assim restauraria a ordem da sua vida. Só que esta decisão precipita a ruína de ambos: Giovanni, já fragilizado e sem dinheiro, comete um acto desesperado e acaba preso e condenado à morte; David, por sua vez, perde Giovanni e também Hella (que descobre a verdade e o deixa), restando-lhe apenas a companhia devastadora da culpa e da solidão. Nos capítulos finais, David perambula de bar em bar, atordoado, e regressa ao quarto vazio de Giovanni, encontrando-o sujo – uma visão quase alegórica do caos emocional e moral em que ele próprio se encontra. A amarga confirmação de perda. Baldwin pinta a imagem de um homem arrasado pela consciência de ter traído o próprio coração e de ter contribuído para a destruição da pessoa amada.
No panorama social, O quarto de Giovanni evidencia como a falta de aceitação (interna e externa) torna impossível qualquer consolo real. David não vive num vácuo: ele é produto de um tempo em que a homossexualidade era condenada, e Baldwin sublinha os efeitos dessa condenação. Personagens secundários, como Jacques (um homem mais velho que serve de mentor cínico) comentam a hipocrisia e a crueldade da sociedade. Numa observação memorável, Jacques diz a David que poucas pessoas morrem de amor, mas inúmeras “perecem… por falta dele” . Esta frase, ainda que proferida por outra personagem, sintetiza bem a mensagem do romance: Giovanni e David não “morrem de amor” no sentido melodramático – em vez disso, um morre literalmente por falta de amor (pela rejeição, pela impossibilidade de viver o amor), e o outro fica espiritualmente desfeito pelo vazio deixado pela ausência desse amor.
A narrativa de David é reflexiva e carregada de simbolismo – o quarto de Giovanni, por exemplo, é descrito quase como um lugar fora do tempo, desordenado, forrado de espelhos manchados e garrafas vazias, que espelham a confusão interna do protagonista e a impossibilidade de uma vida “limpa” naquele amor à margem. A escrita varia entre momentos de beleza lírica (sobretudo ao descrever Giovanni, ou a paisagem francesa ao amanhecer, ou memórias da infância de David) com momentos de crueza (o confronto final entre David e Giovanni é tenso, com Giovanni a clamar por um amor que David não consegue dar). Baldwin é implacável na dissecação psicológica: não poupa o narrador dos seus erros, nem torna Giovanni um santo – são retratados como humanos, demasiado humanos, repletos de contradições. Isso dá ao romance uma qualidade muito intimista e verossímil. O leitor sente empatia pelos dois homens e pressente desde cedo a inevitabilidade trágica, o que confere às tentativas de consolo dos personagens (seja a fuga de David para Hella, seja o álcool que Giovanni consome, seja o próprio isolamento apaixonado no quarto) um ar desesperado de quem se agarra a algo que vai escorregar pelos dedos.
No fim, David observa a madrugada a chegar, a tal manhã terrível, após saber que Giovanni foi executado. Ele prepara-se para deixar a França. Não há redenção explícita. O que há é um profundo luto: luto por Giovanni, luto pelo amor perdido, luto pela identidade rejeitada. A última imagem do livro é David a ver o seu próprio reflexo numa janela antes de partir, e a notar que o seu rosto se mistura com o dia – numa sugestão de que ele levará para sempre consigo a sombra de Giovanni e da culpa. O quarto de Giovanni termina assim em absoluto desamparo: David não encontra consolo algum, restando-lhe apenas a sobrevivência física e as memórias.
Baldwin, ao contar esta história, oferece ao leitor não um conforto, mas um aviso pungente sobre os custos de se negar o amor e a verdade pessoal. QUERO LER! » O Acontecimento, de Annie Ernaux Em O Acontecimento, de Annie Ernaux, encontramos uma abordagem quase documental de um trauma pessoal, escrita décadas depois do ocorrido, numa tentativa de compreender e talvez exorcizar a experiência. Publicado em 2000, narra na primeira pessoa o aborto clandestino que a autora realizou em 1963, quando era uma jovem estudante universitária de 23 anos. Na França daqueles anos, o aborto era ilegal e moralmente condenado – uma mulher solteira grávida enfrentava não só o risco legal e médico, mas também a ostracização social e a vergonha. Ernaux parte de notas de diário da época e da sua memória para reconstruir, com precisão cirúrgica, o itinerário de medo, dor e isolamento que viveu ao tentar pôr fim a uma gravidez indesejada. A narrativa é despida de sentimentalismo e implacavelmente honesta. Ernaux não apresenta a jovem que foi nem como vítima pura, nem como heroína – apresenta-a como alguém determinada a retomar as rédeas do próprio destino, mesmo que para isso tenha de enfrentar a possibilidade da morte em segredo. O “acontecimento” a que o título se refere é ao mesmo tempo singular e comum: singular porque para ela marcou uma ruptura definitiva na vida (um antes e depois), comum porque tantas mulheres passaram pelo mesmo em silêncio. Ernaux procura dar voz a esse silêncio. Ao ler O Acontecimento, percebemos rapidamente que não há consolo nenhum disponível para a protagonista naquele contexto. Ao descobrir-se grávida, ela não pode contar aos pais (seria um escândalo e uma deceção), o namorado não assume responsabilidade e afasta-se, os médicos recusam-se a ajudá-la (um chegou mesmo a dar-lhe uma palestra moralista). A certa altura, Ernaux descreve-se a vaguear pelas ruas, a tentar encontrar alguma informação ou auxílio, para se deparar com portas fechadas – literal e metaforicamente. Numa passagem do livro, recorda a humilhação de ter ido a uma farmácia procurar um remédio abortivo e ser tratada com frieza quando admitiu não ter receita médica: »A ausência de receita denunciava a minha culpa… Foi um dos momentos em que me senti mais desesperada». A jovem Annie carrega o peso do julgamento implícito em cada olhar, e sente que todos podem ver através dela o “pecado” cometido.
A narradora não tem a quem recorrer sem se incriminar. O consolo que lhe resta é apenas a sua própria determinação e, curiosamente, uma espécie de dissociação estoica: Ernaux relata que, após o aborto consumado e a terrível hemorragia que quase a matou, sentiu que aquilo fazia parte da vida, e anotou no diário: “tudo isto faz parte da vida” , como se incluísse o absurdo na sua existência sem drama.
Um dos aspetos mais impressionantes de O Acontecimento é a lucidez tardia com que Ernaux analisa as emoções da jovem que foi. Muitos anos depois, ela olha para si mesma em 1963 quase como um objeto de estudo, mas ao mesmo tempo com profunda empatia. Essa dualidade – a distância e a intimidade – é típica da escrita de Ernaux, que funde autobiografia com análise sociológica. Ela investiga não apenas o que sentiu, mas porque se sentiu assim, ligando a experiência individual à condição coletiva das mulheres daquela época. Por exemplo, Ernaux reflete sobre a vergonha interiorizada e percebe que era “a vergonha das que abortavam e a reprovação das outras” naquele contexto. Esta compreensão posterior não estava disponível para a jovem apavorada de 1963; é conquistada pela escritora madura ao dissecar as memórias.
Em termos existenciais, O Acontecimento mostra uma mulher confrontada com a sua própria mortalidade e solidão, de forma crua. Durante o processo, especialmente quando finalmente encontra uma mulher que realiza o procedimento de forma rudimentar, a narradora experimenta dores lancinantes e um sangramento interminável. Ela chega a pensar que poderia morrer no quarto de estudante, sem ninguém a socorrer, e considera que seria encontrada num cenário horrendo. Essa proximidade da morte – vivida num isolamento absoluto – marca-a para sempre. Ernaux sugere que o evento funcionou como um ritual de passagem perverso: após sobreviver, nada na vida a poderia assustar assim, e adquiriu uma espécie de imunidade em relação às pequenas preocupações mundanas. Contudo, isso não significa que encontrou consolo. Pelo contrário, significa que carregou por muito tempo um trauma sem o elaborar. É na escrita que Ernaux busca algum tipo de resolução. No início do livro, ela declara, quase como um manifesto: «O meu duplo desejo: que o acontecimento se transforme em escrita. E que a escrita seja acontecimento». Esta citação indica que para ela a narrativa deste episódio não é só um exercício pessoal, mas um ato com potencial transformador. Ao transformar o acontecimento em texto, ela realiza uma justiça poética – dá ao aborto clandestino uma visibilidade e uma dignidade que lhe foram negadas no momento em que ocorreu. E ao mesmo tempo, a própria escrita torna-se um novo acontecimento, agora público e partilhado, que pode instigar reflexão social. Por outras palavras, Ernaux escreve para transcender a própria vivência, fazendo dela algo que exista no mundo, que rompa a quietude cúmplice que costuma cercar estes temas.
Esteticamente, a obra é extremamente contida. Ernaux evita qualquer “floreado” literário ao relatar os factos. Ela chega a notar, num meta-comentário, que ao escrever precisa de “resistir, de vez em quando, ao lirismo da raiva ou da dor”, pois “não quero fazer neste texto o que não fiz na vida real nesse momento…: gritar e chorar.” . Esta declaração de intenções revela a ética estilística da autora: ela recusa-se a dramatizar na página aquilo que ela própria se proibiu de exteriorizar quando viveu o aborto. Em 1963, l engoliu os gritos; em 2000, engole as metáforas fáceis ou exageros emotivos. O resultado é uma narrativa quase seca, que descreve por exemplo os detalhes físicos com objetividade (a sonda, o sangue, as tentativas com agulhas de tricô, etc.) de um modo que chega a ser chocante justamente pela falta de histeria. Ernaux também incorpora trechos do diário de então e faz digressões analíticas entre parênteses, o que confere ao texto uma estrutura híbrida: parte relato linear dos eventos, parte meditação temporal (ela no presente a dialogar com a memória). Esta abordagem fragmentada, no entanto, não diminui a força literária – pelo contrário, cria uma sensação de verdade incontestável. O leitor sente que está a aceder ao núcleo duro de uma recordação, sem camadas de enfeites. E nessa transparência há uma forma de respeito: Ernaux respeita tanto a realidade vivida que prefere sub-representar emoções a correr o risco de melodrama. Curiosamente, esse pudor estilístico amplifica a emoção do leitor, que lê nas entrelinhas toda a agonia contida.
No final do livro, Ernaux não declara ter encontrado a paz. Não há uma epifania de consolo explícito. Contudo, há uma cena final marcante: já passadas décadas, ela cruza-se por acaso com o homem que a engravidou, numa gare de comboio, e ele não a reconhece. Ela deixa-o passar anonimamente. Este encontro casual serve para sublinhar que aquela experiência – central para ela – foi irrelevante para ele e invisível para o mundo. Essa assimetria poderia ser revoltante, mas Ernaux relata-a com serenidade, como se constatasse um facto banal. Talvez aí resida algum consolo: em perceber que o acontecimento lhe pertenceu sobretudo a ela, à sua história interior, e que a sua importância independe do reconhecimento alheio. Ao escrever o livro, ela dá a si o reconhecimento que não teve. Podemos inferir que a literatura foi, para Ernaux, o meio de processar a dor e a vergonha que ficaram em suspenso no tempo. Ela própria sugere que começou a escrever este relato para conseguir “alcançar aquelas imagens de janeiro de 64” e integrá-las na sua vida – ou seja, para dar um encerramento que na época não existiu. Nesse sentido, a escrita cumpre um papel quase terapêutico (embora Ernaux seja cautelosa com essa palavra). E para nós, leitores, O acontecimento oferece o consolo peculiar da solidariedade e da indignação partilhada: solidariedade para com aquela jovem sozinha no quarto, indignação pelo que ela teve de passar. O livro transforma um caso individual numa tomada de consciência colectiva sobre as injustiças que geram desamparo. QUERO LER! »

A Campânula de Vidro

de Sylvia Plath

Propriedade Descrição
ISBN: 9789896416140
Editor: Relógio D'Água
Data de Lançamento: agosto de 2016
Idioma: Português
Dimensões: 153 x 234 x 17 mm
Encadernação: Capa mole
Páginas: 248
Tipo de produto: Livro
Coleção: Ficções
Classificação temática: Livros em Português > Literatura > Romance
EAN: 9789896416140
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Um turbilhão de emoções

Catarina Vasconcelos

Um livro que me deixou emocionalmente esgotada, pela sua crueza e verdade. Apesar do desvario emocional, são livros assim que nos fazem sair do nosso círculo e reflectir sobre as idiossincrasias de estar vivo. Recomendo.

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Único e singular

Ana Gonçalves

Autobiográfico ou não, as angústias da doença mental são viscerais e o sofrimento da personagem não deixará nenhum leitor indiferente. Recomenda-se sem hesitações, sobretudo numa perspectiva única de aproximação a um contexto particularmente difícil que terá também sido o da própria autora.

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Ficção autobiográfica...

Ilda Azinhais Velez

O percurso de Esther Greenwood , uma jovem universitária que tem dificuldade em superar o vazio que a começa a invadir, é, afinal, a história de Sylvia Plath... No início , a narrativa cativa pela linearidade, mas , à medida que a depressão se instala e uma metafórica"campânula de vidro" oprime progressivamente a protagonista, a densidade aumenta. A análise lúcida e serena de um ser dominado pela ideia de suicídio, a descrição do ambiente assustador de hospitais psiquiátricos são bons motivos para ler este romance...

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Um livro essencial do século XX

T. R.

Sylvia Plath foi uma escritora que viveu uma vida efémera. Ainda que inicialmente escrito e publicado sob um pseudónimo, "A Campânula de Vidro" descreve muito daquilo que se acredita ser as vivências e experiências de Plath: a sua patologia mental - a depressão -, a sua luta num mundo de homens e numa sociedade competitiva, a busca pela felicidade. Plath escreve-nos num tom que, na época, ascendia ao carácter de moderno, numa prosa quase poética, carregada de significado. Um excelente livro e tradução.

SOBRE O AUTOR

Sylvia Plath

"Com Sylvia Plath a poesia e a ficção do pós-guerra conhecem alguns dos seus momentos mais significativos. Nascida em Boston, a 27 de outubro de 1932, Sylvia Plath revelou-se uma estudante exemplar. Ao longo do seu percurso escolar acumulará sucessivas bolsas de estudo e também alguns prémios literários. Apenas um 'senão' parece 'manchar' esse percurso de exceção: uma tentativa de suicídio no verão de 53 que a afastará temporariamente da universidade.
Em 1955, encontramo-la em Cambridge com uma bolsa 'fullbright'. Será aí que conhece o poeta Ted Hughes com quem casará no ano seguinte. Os anos subsequentes caracterizam-se por uma atividade intensa e disciplinada. Sylvia Plath produz então inúmeros contos e o romance onde recria a sua tentativa de suicídio, 'The Bell Jar' ('A Campânula de Vidro') que será publicado em janeiro de 1963, sob o pseudónimo de Victoria Lucas.
Se a sua atividade no domínio da narrativa é considerável, não o é menos aquela que exerce no da criação poética. Apenas "The Colossus" surgirá ainda durante a sua vida. 'Three Women: A Monologue for Three Voices', 'Winter Trees', e a sua obra-prima 'Ariel', são já trabalhos póstumos. Em 1962, ocorre a separação do casal. A partir de dezembro Sylvia Plath passa a residir em Londres com os seus dois filhos, Frieda e Nicholas. A Inglaterra sofre então um inverno como não havia memória. Sylvia Plath adoece, ficando de cama durante algumas semanas. Na manhã de onze de fevereiro de 1963, suicida-se. Não é demais assinalar a importância da sua obra narrativa e poética, nomeadamente numa altura em que Portugal se vê invadido por um contingente de subprodutos vindo dos Estados Unidos. Como definir de uma forma sintética essa importância? No plano da narrativa, e o essencial a esse nível é 'The Bell Jar', pelo modo como consegue conjugar a experiência pessoal com um distanciamento algo irónico, e pela sua recuperação do legado romanesco modernista.
No plano da poesia, Sylvia Plath consegue dar alguns dos momentos de maior tensão conhecidos pelo género neste século levando ao limite o trabalho das formas e a experiência do eu".
Mário Avelar, in "A Phala", nº 11

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