Há Petróleo no Barreiro - Os Estigmas e os Silêncios da Cidade Industrial
Volume II
de João M. M. Firmino
Sobre
o LivroIlustríssimo senhor - termina o século no meio de um apocalipse social; no meio de farrapos de declamações; farrapos luzentes de teorias; farrapos trágicos de esfomeados…
Há 19 séculos que dura a civilização cristã; e ela caminha, pavorosamente, a passos agigantados, para um enlaivecimento ainda maior que o enlaivecimento romano. Acaso a dinastia dos banqueiros contemporâneos é mais honesta que a dinastias dos Césares e Augustos? Não é. A lama do Panamá, de Dreyfus, de Hooley, vale bem os mistérios da casa de ouro de Nero. Em que se diferem as demências ornamentais dos banqueiros contemporâneos das demências dos antigos Césares em não se permitirem acaso o luxo do circo, e dos mártires às feras? Isso mesmo eles têm: o circo é a bolsa, os mártires são os povos, eles são as feras.
Todo o mundo contemporâneo caminha hoje às cegas, às tontas, como um morcego doido de sol, para um abismo - que é a bancarrota moral. A bancarrota dos estados dessorados e moribundos, segundo a frase ciprestal de Chamberlain, é apenas uma consequência da primeira. Quem é dissoluto, perdulário, amigo dos metais, dos deboches, dos pelotiqueiros, dos ribaldos e palhaços, não pode ser uma consciência alada. As civilizações decadentes terminam sempre pelo amor do metal e da bestialidade humana.
(Excerto da carta de Gomes Leal ao Dr. Campos Salles, publicada no jornal Vanguarda, em 24 de Março de 1900).
Atravessamos uma crise de verdadeira madureza política, a beber vinho que não é vinho, a comer pão mau e caro, a pagar o bacalhau pelo preço da carne, a zurrar com mais de 21 por cento na décima da renda das casas, a ser multado por dá cá aquela palha, e no fim de contas muito curioso, a bisbilhotar as eleições, a fazer intrigas de capote e lenço nos jornais, a interessar-se imenso pela captura dos autores do crime do Barreiro, a ver em que param as modas das carnes, a rir como um maluquinho de Arroios de saudosa memória, e a aumentar a família na razão direta da sua falta de recursos.
(Alfredo Gallis, publicado no jornal Tempo, em 14 de Outubro de 1900).