Em Teu Ventre

Uma perspetiva diferente das aparições de Fátima. Bom livro para crentes e não crentes.

Muito teria a dizer (de bem) desta obra do JLP, pois além das minhas ideias e convicções, tive o privilégio de tocar ideias com o autor aquando da apresentação da sua obra na Fnac da Guia. Tive a oportunidade de lhe dizer que, de toda a sua obra por mim lida (apenas tenho em falta dois livros) este é o livro de que mais gostei. Para mim a questão das aparições de N.ª Senhora não são o mais importante no livro, mas sim a questão da(s) maternidade(s) e da própria relação que o JLP manterá com a sua própria mãe, como tive a oportunidade de lhe dizer. Dependendo do espírito e da intenção com que se lê esta obra, para mim é uma leitura autêntica, profunda e muito reflexiva, além de um espelho de parte da ruralidade em Portugal no início do século XX.

Gostei deste livro como tenho gostado dos outros livros deste escritor. Espelha bem a vivência naquela época e naquele meio. Acreditar ou não diepende de cada um e é difícl concluir a posição do escritor, mas também acho que isso não foi importante para o resultado final

Numa virada completa no que são os seus "terrenos habituais" José Luís Peixoto aventura-se por uma temática que poderia revelar-se polémica. No entanto, essa possibilidade desvanece-se, pois os temas explorados voltam a ser o íntimo dos seus personagens e a riqueza do seu universo interior, não colocando em causa quaisquer crenças "gerais". Uma excelente forma de abordagem ao tema, que no final de contas, apenas serve de pretexto para mais uma excelente obra!

O ponto de partida são as aparições de Fátima, entre maio e outubro de 1917. Lúcia é a personagem de mais destaque, mas a personagem principal é de facto todo um povo que encarou os acontecimentos de modos totalmente diferentes. Dos que, de mês para mês, seguiam os pastorinhos à azinheira com mais e mais convicção, passando pelos que ali viam uma oportunidade de negócio, aos simplesmente céticos que não conseguiam acreditar. Entre estes últimos está a mãe da própria Lúcia, que começa por achar que a filha está a imaginar mas que, a dado momento, tem de a proteger do povo e da própria Igreja. Neste livro não são descritas as aparições, mas as consequências que os seus relatos provocam, primeiro na aldeia e depois no resto do país. É também um retrato do Portugal de início do século XX, com a sua miséria, fé e esperança. Apesar de ter gostado do livro, não consigo deixar de temer que José Luís Peixoto comece, aos poucos, a aproximar-se de uma escrita mais hermética (por vezes fez-me lembrar o António Lobo Antunes de hoje, de que não gosto nada). Pela alternância entre narradores, que no início tive dificuldade em identificar, e pela própria forma escolhida para o livro. Aguardo por um próximo livro com a esperança de não comprovar esta teoria.

Tal como nos livros anteriores este tipo de leitura prende-me, só descanso quando termino de ler, foi uma leitura rápida e fascinou-me a escrita do José Luis Peixoto. tal como em leituras de livros anteriores foi num instante que "devorei" mais este livro. Já recomendei e sei que já houve quem comprou por influência minha.

Para esta geração de leitores das obras de JLP que não eram nascidos à data das aparições de Fátima, esta grande obra coloca-nos no centro da história, transportado-nos para o centro dos acontecimentos. A cultura e maturidade literária do escritor, estão cada vez melhor, pois quem lê ou começa a ler não consegue parar. As palavras são como um mel doce que nos alimenta a gula.

Esperava por uma abordagem mais ficcional /agnóstica e não tão submetida.

Sem sombra de dúvida, o génio criativo de José Luís Peixoto está cada vez melhor. O pormenor de recriar as aparições de Fátima é mostra disso. Um grande livro.

José Luís Peixoto recria as aparições de Fátima, em 1917. Colocando a acção num espaço rural (sua escolha preferencial em várias narrativas), aí desfilam a crença, a dúvida, a mentira (excelente reflexão nas páginas 65-66) e a vida da classe popular numa dimensão polifónica, de onde sobressai o «diálogo» entre a Mãe e o Filho e a contaminação textual com o texto bíblico.