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Rebentar

de Rafael Gallo

Livro eBook
editor: Porto Editora, outubro de 2023

«Um filho desaparecido é um filho que morre todos os dias. Nem mesmo nas mitologias mais cruéis há tragédia equivalente; essa dor nenhum deus teve de suportar. Cada noite, ao cair, desaba sobre os pais com o peso renovado da notícia: você perdeu sua criança e ela está naquela escuridão afora, desprotegida. Essa mensagem silenciosa se impregna nas paredes da casa, nos vãos entre os azulejos, nos ponteiros dos relógios e nas páginas dos calendários, nos retratos da família, no chão que se pisa.»

É esta a morte que Ângela tem enfrentado ao longo dos últimos trinta anos, até ao dia em que decide pôr um fim à espera, certa de que o seu filho, Felipe, não retornará à casa que manteve intacta, nem ao quarto da criança que ele já não será.

A voz de Rafael Gallo, sempre acutilante, acompanha o sofrimento desta mãe, por vezes num grito ensurdecedor, constante como as ondas que vêm rebentar junto ao pontão onde Ângela tenta afogar a dor, outras vezes num grito tão silencioso como a espera.

Numa literatura brasileira cada vez mais entrincheirada e banalizada, Rafael Gallo é uma pérola.?

Revista LER

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«A escrita é um movimento que volta sempre para dentro» – Entrevista a Rafael Gallo

Rafael Gallo, autor premiado e conhecido pela sua habilidade em narrativas curtas e introspectivas, partilha com os leitores um percurso fascinante que cruza a música e a literatura. Formado em música para TV e cinema, Gallo encontrou na escrita uma nova forma de expressão criativa. O autor de obras como Rebentar e Dor Fantasma reflete sobre as dificuldades de ingressar no mundo editorial, a inspiração que encontrou em grandes clássicos como José Saramago e Guimarães Rosa, e a relação pessoal com suas personagens, onde revela um pouco de si mesmo.
Nesta entrevista, Gallo fala também sobre os desafios de romper a rigidez de suas histórias como tem vindo a repensar sua relação com a escrita. Um diálogo profundo sobre o papel do íntimo na literatura e o equilíbrio entre o silêncio, a música, e a palavra escrita.

Formaste-te e trabalhaste em música para tv e cinema. O que te levou a dar o salto para a escrita?
Desde que me conheço, tenho um impulso criativo. A maneira de expressar essa criatividade mudou ao longo do meu crescimento, mas todas as artes mexem comigo. A literatura chamou-me por causa do gosto pela leitura – quis contribuir com a minha parte, e comecei a escrever quase como uma atividade de lazer, sem pretensão nenhuma. Mas depois comecei a olhar para a escrita como uma aprendizagem para a qual eu não tinha muita habilidade, mas que, com prática, podia melhorar. E foi o que fiz, até ao ponto em que comecei a escrever textos que realmente achava que podiam estar num livro, que eu gostaria de ler. Acho que essa é a grande referência. E, a partir daí, a escrita começou a desenvolver-se. Rafael Gallo, Foto © Wilian Olivato Houve algum autor que tenha ajudado a moldar o teu caminho enquanto escritor?
Sim, houve muitos, sobretudo os clássicos. Eu conhecia muito pouco da literatura contemporânea, o que acho que é um problema cultural no Brasil, onde esta está muito fora da circulação central. A única figura viva que eu conhecia era o José Saramago. Ele foi uma grande influência, juntamente com os clássicos que já lia como Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Machado de Assis. Esses foram os primeiros nomes que ajudaram a semear a minha escrita.   «O Prémio Saramago [atribuído a Dor Fantasma] salvou-me e resgatou a minha confiança.» Enfrentaste alguns desafios para conseguires publicar o teu primeiro livro. Foi difícil?
Sim, sobretudo porque não sabia como funcionava o sistema editorial. Já estava quase a desistir, mas acabei por ganhar o Prémio Sesc, no Brasil, em que o vencedor vê o seu inédito publicado por uma grande editora. Esse foi o início. Nesse momento, percebi: «Aparentemente, sou um escritor.» Deve ter sido um momento marcante.
Sim, foi uma realização. Vivi aquele drama de um artista que ainda não encontrou o seu lugar. Ficas na dúvida se o que pensas sobre ti mesmo faz sentido ou se é uma grande loucura. Quando vem esse reconhecimento, é uma afirmação de que, afinal, não estás louco. Aquilo que vês em ti mesmo pode ser visto por outras pessoas e validado – é um acordo com o público.

O que te dá mais prazer escrever: contos ou romances? E que desafios apresenta cada género para ti?
São duas coisas bem diferentes, com desafios e recompensas distintas. No caso dos contos, mesmo que não saiba exatamente como vão terminar, ficam num certo espaço circunscrito que quase dá para ver na totalidade desde o início.
O romance é diferente. No início, a sensação é como se estivesse a conduzir na estrada com nevoeiro. Vês só um pouco à tua frente, sabes que ainda tens muito que andar, mas não consegues imaginar o que vem a seguir. O romance permite explorar muito mais o terreno de uma história. Em Rebentar, que é sobre a mãe de um filho desaparecido, teria de escolher algum elemento que representasse esse filho – poderia ser o quarto dele, a casa, ou os retratos na casa. Vencida essa primeira ansiedade, é bastante recompensador. Podemos encontrar um pouco de ti no protagonista de Dor Fantasma?
Eu queria falar de uma determinada pessoa, mas não queria chamá-la pelo nome, porque isso seria quase ofensivo. Então, a personagem acaba por ser uma mistura de várias figuras com as quais convivi. Mas também tem muito do que essas figuras deixaram em mim. São, de certa forma, fantasmas com os quais também batalho. Há aquela velha história do «Emma Bovary c’est moi» e, nessa mescla de várias pessoas, há um pouco de mim no Rômulo, assim como na Marisa, no Franz e na Ângela. Acho que, em todas as personagens, alguma coisa minha acaba por entrar.

É verdade que, como disse Pilar del Río, Dor Fantasma representou para ti um novo começo?
Sim, é verdade, especialmente por causa do Prémio Saramago e por ter a Pilar a falar sobre um livro meu, e por todo esse novo universo que se abriu para mim. Aqui em Portugal, Dor Fantasma, foi o meu primeiro livro e representou aquele momento em que fui apresentado enquanto autor.

Precisavas deste reconhecimento e do apoio do mundo editorial para não desisitires de escrever, recuperares a auto-confiança?
Esse livro marcou um recomeço para mim, em vários sentidos. Acabei de escrevê-lo pela primeira vez no final de 2019. Depois, veio 2020 com a pandemia, e o livro foi recusado por alguns editores. Nesse período, tive uma crise pessoal imensa. A minha vida passou por várias transformações, e senti que tinha perdido a minha relação com a escrita. Felizmente, o prémio salvou-me e resgatou a minha confiança. Se não tivesse ganho o prémio, Dor Fantasma teria grandes chances de ir parar ao lixo, o que é estranho pensar agora.   «Para mim, a escrita é sempre um movimento que volta para dentro.» Dor Fantasma foi editado novamente. Por que foi importante alterá-lo?
Saí do período da pandemia a sentir que o que escrevi já não refletia o que sinto e penso. Reescrevi Dor Fantasma para o prémio, para que essas histórias refletissem essa mudança, o que fez uma grande diferença no livro, especialmente em relação à rigidez do Rômulo, tema central da história. Percebi que a narrativa era rígida e tive de aprender a quebrar isso em mim primeiro, e depois na história, nos diálogos, nas situações íntimas da casa, do Rômulo com o filho. Há momentos no livro em que se respira por contraste, essa austeridade é muito presente, mas há também um equilíbrio entre o que há de bom e de mau. Acho que, ao longo do livro, conseguimos perceber que, na vida, podemos ser mais flexíveis, mais tolerantes connosco mesmos. Os teus romances são sobretudo introspectivos. O nosso íntimo domina sempre a nossa existência?
Acredito que sim. Às vezes leio escritores que fazem grandes analogias com a história, com a filosofia, entrecruzando ideias, e sinto uma certa inveja, porque o meu pensamento não funciona assim. Para mim, é sempre um movimento que volta para dentro. Mesmo que eu escreva sobre algo político ou social, como um governo ditatorial, provavelmente focaria no íntimo dessa figura. Quero explorar o que um tirano pensa quando está sozinho, por exemplo, no banho, sem o poder e a influência que o rodeiam.

Que livro estás a ler neste momento?
Acabei de terminar O Perigo de Estar no Meu Perfeito Juízo, da Rosa Montero, que adorei. É um livro incrível onde ela aborda a loucura, os transtornos psiquiátricos e a criatividade. Foi uma leitura que me incentivou a explorar referências externas ao livro. Ela menciona artistas, autobiografias e temas que me fizeram querer pesquisar e aprender mais, como o caso do filho de Sylvia Plath, que também se suicidou. É um livro muito inspirador.

Como vês o surgimento da nova geração de autores brasileiros?
Felizmente, houve um reavivamento, em grande parte devido às redes sociais e à internet, que nos imerge o tempo todo. Isso permitiu trocas que faltavam antes, fundamentais para a valorização dos autores contemporâneos. Mas há uma coisa que eu estranho um pouco em mim mesmo, e acho que ninguém mencionou nunca. É que, embora eu ame escrever e isso seja uma parte fundamental da minha vida, eu não sou uma pessoa que está sempre a ler, o que talvez seja um pouco inesperado para alguém que é escritor. Não que eu não goste de ler, mas sou muito seletivo com as minhas leituras e, às vezes, passo longos períodos sem ler nada, simplesmente porque não sinto vontade, preciso de pausas, para poder voltar à leitura, e à escrita, com a mente mais fresca.

E o que fazes nesses períodos em que não estás a ler ou a escrever? Tens outras paixões que te ajudam a manter esse equilíbrio?
Sim, uma delas é a música, uma parte importante da minha vida. Gosto de tocar violão, de experimentar com sons, e isso ajuda-me a expressar emoções de uma forma diferente da escrita. Além disso, sou uma pessoa que aprecia muito o silêncio e o tempo sozinho, caminhadas, meditação... Esses momentos de pausa, longe dos livros e da escrita, são tão importantes quanto os momentos de imersão nas histórias. Eles permitem que eu me reconecte comigo mesmo e com o mundo ao meu redor, e isso, de certa forma, acaba alimentando a minha criatividade quando volto a escrever.

Rebentar

de Rafael Gallo

Propriedade Descrição
ISBN: 978-972-0-03726-8
Editor: Porto Editora
Data de Lançamento: outubro de 2023
Idioma: Português
Dimensões: 152 x 235 x 21 mm
Encadernação: Capa mole
Páginas: 264
Tipo de produto: Livro
Classificação temática: Livros em Português > Literatura > Romance
EAN: 978972003726810
Idade Mínima Recomendada: Não aplicável
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O retrato da angústia e da força para seguir

Ana Isabel Vieira

Gostei muito deste livro de Rafael Gallo, o primeiro que li deste autor. Trata-se de um retrato muito límpido da angústia vivida pelo desaparecimento de um filho. É nos descrita a estagnação do tempo e da vida apenas focada na tristeza e na esperança do encontro, o confronto com múltiplas possibilidades que defraudam essa esperança...e a força que é precisa para aceitar, seguir e ver além do desaparecimento e da perda irreversível. Uma força que em nada desvaloriza a dor ou anula o amor pelo filho. Mas que demarca a coragem para avançar, mesmo com uma ausência sempre presente.

Rafael Gallo

Rafael Gallo nasceu em São Paulo, no Brasil, onde publicou o romance Rebentar (2015), vencedor do Prémio São Paulo de Literatura e já publicado pela Porto Editora, e Réveillon e outros dias (2012), livro de contos vencedor do Prémio Sesc de Literatura. Tem ainda diversos textos em antologias e coletâneas, incluindo publicações em países como França, EUA, Cuba, Equador e Moçambique. Com Dor fantasma, foi laureado vencedor do Prémio Literário José Saramago 2022. Atualmente reside em Portugal.

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