Nocturnidade

Porque se serve da palavra, a corromper
estas imagens deslizando nos seus olhos,
como se, ao escrevê-las, alguma coisa
lhe levasse a sede até aos frutos rasgados

da alba? Porque a joga, como renda de fumos,
se ela passa por entre nada, pelos ângulos duros
dos móveis, oleosa tinta do silêncio?
O que espanta nos olhos de Laura é sua mansa

existência, a divergência entre o que pensa
e o que quer, entre o espaço que habitam e o voo
das cores, o sopro veloz da sua passagem.

Poderiam os olhos de Laura ser traduzidos
pelas palavras, se estas não são o pensamento,
mas a expressão da sua própria morte?