Inconfidências de uma Vida a Preto e Branco Livro
de Luís Telésforo
Sobre
o LivroA partir de Trás-os-Montes, suas aldeias e hábitos, o autor enquadra as origens do personagem central que, a partir de certa altura enfrenta a vida à sua maneira. nos actos e condutas que lhe percebemos, a teimosia e alguma irreverência de Jorge marcam a atitude isolada e convicta. Em Inconfidências de uma vida a preto e branco deparam-se pistas, nunca soluções, para interrogações prováveis do autor. - Quantos de nós não vivemos, tentando ignorar, perguntas íntimas latentes?
"Sempre ansioso por voltar à terra, Artur já se tinha habituado a Lisboa, àquela liberdade que continuava a aprender, de forma tardia, depois daqueles quase dez anos passados entre Mogofores e Poiares da Régua. no entanto, a aldeia, o rincão trasmontano e o calor da mãe apressavam¬ no a que poupasse uns escudos e arranjasse uns dias para dar notícias a D. Margarida. Mesmo que a reacção não fosse efusiva, sabia como o filho de Lisboa era aquela âncora de sempre." [p. 9]
Falar de um livro de um amigo é sempre difícil, mas poderá ser algo bastante penoso se não gostarmos do livro. O que não aconteceu de todo com este livro do Luís Telésforo. Eu adorei o livro. O Luís conta-nos as histórias Artur e do Jorge que embora aparentemente distintas estão ligadas por um grau de parentesco bastante forte. Com estes dois homens nós vamos conhecer uma realidade temporal que nada tem a ver com os nossos dias, o Estado Novo e as condicionantes que Portugal tinha nos anos da ditadura. Artur é um jovem que foi obrigado a largar a sua terra, os seus e nossos Trás-os-Montes para vir ser ‘alguém’ na capital. Regressa à sua aldeia, onde permanece a sua mãe, e aí encontra o amor, embora regresse a Lisboa para não abdicar dos seus sonhos. Jorge é um menino de Benfica, obrigado a crescer depressa e cuja formação familiar é complementada com os colegas, professores e funcionários, do Liceu Camões. E assim se desenvolve uma história que sendo destas duas personagens, sendo do Luís Telésforo, poderia ser de muitos portugueses que foram obrigados a serem melhores e maiores do que o seu país. Na verdade, parece-me que as inconfidências não são das personagens, mas sim do escritor e dos leitores numa época em tudo estava a preto e branco e que dificilmente se poderia sonhar a cores. Mas mais do que a história o Luís leva-nos a todos os amantes da literatura a um convívio com os grandes nomes que pelo Liceu Camões passaram. De Virgílio Ferreira a Mário Dionísio, de Bénard da Costa a Ema Tarracha, todos os nomes que nos criaram como leitores estão presentes dentro de um edifício que é mítico para a cidade de Lisboa e para os lisboetas. Mas há mais. Há uma escrita que sendo simples e objetiva nos recorda os grandes clássicos do Romantismo. Ao ler este livro lembrei-me de Júlio Dinis e de uma escrita correta, adjetivada sem exageros, descritiva sem se tornar exaustiva, criando um ambiente seja ele citadino ou campestre que nos remete para os lugares que a nossa imaginação literária foi desenvolvendo nos leitores. A veia poética do autor está presente na construção de uma narrativa que sendo verdadeira, não deixa de nos levar à nossa infância e aos nossos lugares míticos. Assim sendo, recomendo sem margem para dúvidas estas Inconfidências do Luís Telésforo.