Escola de Espiões

Venha espiar com espiões

A coisa funciona bem porque, mais do que o usufruto, deixa ao leitor a tarefa de montar um puzzle. Assim, a leitura é forçosamente ativa. Fica um conjunto de livros em que o leitor tem de agir com as personagens.

  O comprometido O mistério chega-nos do Vietname até à Europa. Vo Danh é um ex-espião vietnamita que vive agora em Paris. Tenta habituar-se a França, mas não deixa de ver o país como o que colonizou o seu, e com isto Nguyen lança uma visão panorâmica sobre o colonialismo francês e a herança da guerra no Vietname. A ação passa-se no início da década de 1980. Vo Danh sobreviveu a uma viagem atribulada com o irmão, Bon. Os dois trazem as marcas do tempo que passam num acampamento de reeducação gerido por outro irmão, Man. Bon defende a causa comunista sem saber que os dois irmãos eram espiões que operavam em segredo contra ela. No meio disto, ainda há o fanatismo em ação e a forma como as ideologias se tornam em empecilhos quando transformadas em dogmas. Estando isto estabelecido, resta a desumanização do outro. VER MAIS »







  Berta Isla É um grande romance de um grande autor. A narrativa explora a história de um casal – Berta Isla e Tomás Nevinson – ao longo de décadas (1969-1990). Tomás fora recrutado pelos Serviços Secretos britânicos para cumprir funções de infiltrado e a narrativa foca-se essencialmente na vivência da sua ausência por parte de Berta Isla. Ao longo da narrativa, esta transforma-se na mulher à espera do marido, sem saber quando/se vem, acreditando que voltará mesmo quando tudo indica que não o fará. A certa altura, ao leitor já não parece razoável que continue à espera, e a esperança já é mais uma espécie de fé cega. Ao seguirmos a vida dela, seguimos também todo o pano de fundo, que é crucial à narrativa. VER MAIS » Tomás Nevinson Se falamos de Berta, falemos também de Tomás. Este é mais um calhamaço do autor espanhol, e que bom é lê-lo. No que Marías faz, parece não haver qualquer desejo de deixar pontas por atar, e aqui está de novo o abismo humano escancarado. A sua prosa é explicativa, maximalista, vai ao detalhe e parece ter o intuito de dar tudo ao leitor, mesmo que manipule o tempo de forma a ir doseando a oferta. Depois de, no romance anterior, termos tido a perspetiva de Berta, agora temos os olhos de Tomás. Com isto, vemos o que nos estava vedado e mergulhamos na ausência de Tomás a partir de dentro. Ao estarmos com ele, e sabendo como a sua ausência foi sentida, não há como nos desligarmos da ideia de que o espião faz falta noutro lado. A sensação é de permanente desconcerto: afinal, ao aceitar ser espião, Tomás aceitou também impulsionar o seu teatro e viver à margem da sua vida. Convém ainda acrescentar que os dois romances se fazem quase à margem um do outro, já que o tempo de distância obrigou Berta e Tomás a fazerem as suas vidas em separado. VER MAIS » Silverview É a obra póstuma de John le Carré e também esta se volta para o mundo secreto. No livro, Julian Lawndsley gere uma livraria numa pequena vila inglesa depois de ter deixado um cargo de alto nível na City. Meses depois de se ter instalado, recebe a visita de Edward Avon, imigrante polaco ali residente, que parece saber muito sobre a família de Julian e afirma ter estudado com o seu pai, um velho vicário que, ao morrer, deixou de herança uma dívida à família. Como já se espera em le Carré, a partir daí, a vida pacata transforma-se noutra coisa e entra-se no mundo do autor inglês, não se percebendo logo se Edward realmente conhecia o pai de Julian. Ao longo da narrativa, o leitor apanha-se ainda entre a Polónia e a dissolução da Jugoslávia. VER MAIS »