Minientrevista a Marta Hugon, finalista do Prémio WOOK Novos Autores
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9 de dezembro de 2024
Marta Hugon nasceu em Lisboa, em 1971, e a sua vida tem-se desenrolado sempre à volta da música, como cantora e compositora. Além de cinco discos em nome próprio, é professora na Escola de Jazz Luiz Vilas Boas e cocriadora do projeto a três vozes «Elas e o Jazz». Mas a interpretação que faz do mundo extravasa o plano musical. Além de escrever para publicidade, Marta Hugon – que se estreou na literatura com a publicação do conto «Conceição» na revista Granta em Língua Portuguesa – , lançou em abril deste ano Souvenir, o seu primeiro livro.
Souvenir é uma coletânea de contos em que personagens comuns se constroem em torno da memória e da intimidade humana. Cada história é como uma peça de um quebra-cabeças emocional, unida por objetos, lugares e músicas. Experiências do passado desvendam traumas, redenção e coragem diante das adversidades. A memória ganha corpo, e a linguagem aborda poeticamente o tempo e a nostalgia.
Nesta entrevista ao wookacontece, a autora revela-nos como Souvenir nasceu de uma epifania em relação ao papel que a memória joga na definição da identidade e da própria escrita. Marta escreve como gosta de ler e acredita que o estilo nasce da vontade de servir a história, da mesma forma que a interpretação deve servir a música.
Souvenir é uma coletânea de contos em que personagens comuns se constroem em torno da memória e da intimidade humana. Cada história é como uma peça de um quebra-cabeças emocional, unida por objetos, lugares e músicas. Experiências do passado desvendam traumas, redenção e coragem diante das adversidades. A memória ganha corpo, e a linguagem aborda poeticamente o tempo e a nostalgia.
Nesta entrevista ao wookacontece, a autora revela-nos como Souvenir nasceu de uma epifania em relação ao papel que a memória joga na definição da identidade e da própria escrita. Marta escreve como gosta de ler e acredita que o estilo nasce da vontade de servir a história, da mesma forma que a interpretação deve servir a música.
Marta Hugon – Foto © Rita Carmo
Como surgiu a ideia para este livro?
Os contos deste livro já andavam na minha cabeça há muito tempo. Na verdade, tinha várias ideias que me atormentavam todas as noites e que um dia me levantei para escrever. Comecei com o conto que fecha o Souvenir, “O Fim do Mundo”, que foi uma espécie de catalisador para o resto do livro. Depois de escrever o “Conceição”, que saiu na Granta, percebi que todas as histórias, apesar de muito diferentes entre si, tinham como ligação um fio de memória que se ia desenrolando à medida que as personagens se revelavam, rememorando os seus traumas ou sendo surpreendidas pela memória – ficcional ou não – da sua própria existência. O nome Souvenir, muito ligado à ideia do simbolismo do objecto, com uma carga até um pouco datada, dá nome ao livro e a um dos contos, onde eu tive uma espécie de epifania, muito à semelhança daquilo que o narrador desse conto experimenta. Uma epifania em relação ao papel que a memória joga na definição da identidade e da própria escrita.
Tem uma rotina de escrita?
Não tenho, infelizmente. Espero que isso venha a mudar. Preciso do silêncio absoluto, de estar sozinha, o que implica que escrevi este livro sobretudo de noite e de madrugada, quanto não tinha interrupções. Tenho uma existência um pouco caótica, mas acabo por encontrar a ordem nesse caos quando consigo criar. Para depois poder desarrumar tudo outra vez.
Como lida com um bloqueio criativo?
Aceito a paragem obrigatória, afasto-me um pouco do trabalho e depois volto a insistir, até conseguir desbloquear. Desligar e voltar a ligar do objecto de criação costuma ajudar. Mas não há como voltar à carga e tentar, uma e outra vez. A prática faz a perfeição. Geralmente aproveito esses períodos para rever o texto e estou sempre a limpar, até ficar só com aquilo que é estritamente necessário para contar a história e torná-la interessante do ponto de vista do leitor. Escrevo como gosto de ler. Tenho horror ao maneirismo na linguagem e acredito que o estilo nasce da vontade de servir a história, da mesma forma que a interpretação deve servir a música e não o contrário.
Os contos deste livro já andavam na minha cabeça há muito tempo. Na verdade, tinha várias ideias que me atormentavam todas as noites e que um dia me levantei para escrever. Comecei com o conto que fecha o Souvenir, “O Fim do Mundo”, que foi uma espécie de catalisador para o resto do livro. Depois de escrever o “Conceição”, que saiu na Granta, percebi que todas as histórias, apesar de muito diferentes entre si, tinham como ligação um fio de memória que se ia desenrolando à medida que as personagens se revelavam, rememorando os seus traumas ou sendo surpreendidas pela memória – ficcional ou não – da sua própria existência. O nome Souvenir, muito ligado à ideia do simbolismo do objecto, com uma carga até um pouco datada, dá nome ao livro e a um dos contos, onde eu tive uma espécie de epifania, muito à semelhança daquilo que o narrador desse conto experimenta. Uma epifania em relação ao papel que a memória joga na definição da identidade e da própria escrita.
Tem uma rotina de escrita?
Não tenho, infelizmente. Espero que isso venha a mudar. Preciso do silêncio absoluto, de estar sozinha, o que implica que escrevi este livro sobretudo de noite e de madrugada, quanto não tinha interrupções. Tenho uma existência um pouco caótica, mas acabo por encontrar a ordem nesse caos quando consigo criar. Para depois poder desarrumar tudo outra vez.
Como lida com um bloqueio criativo?
Aceito a paragem obrigatória, afasto-me um pouco do trabalho e depois volto a insistir, até conseguir desbloquear. Desligar e voltar a ligar do objecto de criação costuma ajudar. Mas não há como voltar à carga e tentar, uma e outra vez. A prática faz a perfeição. Geralmente aproveito esses períodos para rever o texto e estou sempre a limpar, até ficar só com aquilo que é estritamente necessário para contar a história e torná-la interessante do ponto de vista do leitor. Escrevo como gosto de ler. Tenho horror ao maneirismo na linguagem e acredito que o estilo nasce da vontade de servir a história, da mesma forma que a interpretação deve servir a música e não o contrário.
Qual é a pior e a melhor parte de ser escritora?
A pior parte é não conseguir sempre tempo para escrever e a angústia que se vive quando não se escreve, um sofrimento um pouco neurótico de quem se pergunta, “mas o que é que eu estou aqui a fazer?”. A melhor parte é a possibilidade das histórias e das personagens, que são muito diferentes das do autor. É um cliché literário bastante verdadeiro, esse de nos surpreendermos com as revelações que as próprias histórias nos trazem. Penso que há um processo inconsciente durante a escrita que é veículo para a criatividade e que tem o seu quê de mistério. Essa descoberta é um fascínio permanente. A escrita é a possibilidade de um sentido e uma conquista dentro do absurdo com que a vida diariamente se reveste.
A pior parte é não conseguir sempre tempo para escrever e a angústia que se vive quando não se escreve, um sofrimento um pouco neurótico de quem se pergunta, “mas o que é que eu estou aqui a fazer?”. A melhor parte é a possibilidade das histórias e das personagens, que são muito diferentes das do autor. É um cliché literário bastante verdadeiro, esse de nos surpreendermos com as revelações que as próprias histórias nos trazem. Penso que há um processo inconsciente durante a escrita que é veículo para a criatividade e que tem o seu quê de mistério. Essa descoberta é um fascínio permanente. A escrita é a possibilidade de um sentido e uma conquista dentro do absurdo com que a vida diariamente se reveste.
Há algum tema sobre o qual não goste de ler ou escrever?
Francamente não me ocorre nada.
Se pudesse partilhar um jantar com qualquer autor (vivo ou morto), quem escolheria?
Quem escreve sabe que os escritores podem não ser bem aquilo que parecem. Nunca fantasiei muito com os autores que admiro. Lembro-me, no entanto, de há muitos anos ter ficado fascinada com os contos de um autor galego, Manuel Rivas, e de ter quebrado essa regra. Mas não desdenharia de um almoço com Clarice Lispector ou Sophia de Mello Breyner, de um café com Paul Auster ou Henry Miller ou de uma tarde à beira-mar com Mário Vargas Llosa.
Qual o livro já devia ter lido e ainda não leu?
Se fosse só um, não estávamos mal. Estou sempre a ler escritores que falam sobre livros que não li e isso gera enorme ansiedade! Ocorre-me assim de repente a tetralogia O Quarteto de Alexandria, de Lawrence Durrell e O Idiota do Dostoievski, que acabaram de me oferecer, mas que ainda não comecei a ler. Musil e Pynchon também são autores que estão por descobrir.
Qual o livro que mais o marcou até hoje?
Não posso nomear apenas um.A Serpente Emplumada de D. H. Lawrence, Delta de Vénus de Anais Nin, Léah e Outras Histórias de José Rodrigues Migueis, O Tempo, Esse Grande Escultor e “As Memórias de Adriano, de Marguerite Yourcenar, As Canções de António Botto, O Meu Último Suspiro, de Luis Buñuel, A Confissão de Lúcio, de Mário de Sá Carneiro, para nomear alguns.
Qual foi o último livro que ofereceu?
Mesmo a propósito, um livro que acaba de sair também pela Tinta da China, que se chama O que Lêem os Escritores, com participação de vários autores que discorrem precisamente sobre os livros que os marcaram.
Francamente não me ocorre nada.
Se pudesse partilhar um jantar com qualquer autor (vivo ou morto), quem escolheria?
Quem escreve sabe que os escritores podem não ser bem aquilo que parecem. Nunca fantasiei muito com os autores que admiro. Lembro-me, no entanto, de há muitos anos ter ficado fascinada com os contos de um autor galego, Manuel Rivas, e de ter quebrado essa regra. Mas não desdenharia de um almoço com Clarice Lispector ou Sophia de Mello Breyner, de um café com Paul Auster ou Henry Miller ou de uma tarde à beira-mar com Mário Vargas Llosa.
Qual o livro já devia ter lido e ainda não leu?
Se fosse só um, não estávamos mal. Estou sempre a ler escritores que falam sobre livros que não li e isso gera enorme ansiedade! Ocorre-me assim de repente a tetralogia O Quarteto de Alexandria, de Lawrence Durrell e O Idiota do Dostoievski, que acabaram de me oferecer, mas que ainda não comecei a ler. Musil e Pynchon também são autores que estão por descobrir.
Qual o livro que mais o marcou até hoje?
Não posso nomear apenas um.A Serpente Emplumada de D. H. Lawrence, Delta de Vénus de Anais Nin, Léah e Outras Histórias de José Rodrigues Migueis, O Tempo, Esse Grande Escultor e “As Memórias de Adriano, de Marguerite Yourcenar, As Canções de António Botto, O Meu Último Suspiro, de Luis Buñuel, A Confissão de Lúcio, de Mário de Sá Carneiro, para nomear alguns.
Qual foi o último livro que ofereceu?
Mesmo a propósito, um livro que acaba de sair também pela Tinta da China, que se chama O que Lêem os Escritores, com participação de vários autores que discorrem precisamente sobre os livros que os marcaram.